Menalton Braff e o milagre da literatura nas prisões – Fundação "Prof. Dr. Manoel Pedro Pimentel" – Funap

Menalton Braff e o milagre da literatura nas prisões

“Tê-los atingido provoca uma sensação diferente, uma realização emocional muito importante”


Menalton João Braff nasceu no ano de 1938 em Taquara, um município com pouco mais de 54 mil habitantes na Região Metropolitana de Porto Alegre, no estado do Rio Grande do Sul.

Durante o período escolar já se mostrava interessado por literatura e política. Estudou Letras na Universidade São Judas Tadeu em São Paulo, onde começou a lecionar logo depois, como professor assistente. Foi professor de literatura brasileira no Ensino Médio em escolas particulares de Catanduva, Batatais, Ribeirão Preto, Ituverava entre outras.

Hoje, aposentado, mora próximo a Ribeirão Preto, em Serrana, onde dedica seu tempo à escrita. Contista, romancista e novelista brasileiro, tem a marca de 25 livros publicados. Seus dois primeiros livros foram publicados em 1984, sob o pseudônimo Salvador dos Passos, nome de seu bisavô, a fim de ocultar o sobrenome de origem europeia.

Somente em 1999 abandonou o pseudônimo para publicar o livro de contos “À Sombra do Cipreste”, que viria a ser o vencedor do Prêmio Jabuti de Literatura em 2000, na categoria “Livro do Ano – Ficção”.

Em entrevista exclusiva, o autor conta sobre a vida no magistério, na literatura e suas impressões sobre o sistema prisional.

Dentro de sua vasta carreira literária, uma de suas obras, “Que Enchente me Carrega”, faz parte do repertório de livros do Programa de Incentivo à Leitura – Lendo a Liberdade, iniciativa da Fundação ”Prof. Dr. Manoel Pedro Pimentel” – Funap, que incentiva a formação de leitores nas unidades prisionais de São Paulo.

Através do programa, detentos do Estado de São Paulo têm a chance de ler uma obra por mês e produzir resenhas, podendo redimir sua pena. Menalton vê como um milagre que seu livro possa atingir essa população: Para um autor, é sempre prazeroso saber que a garrafa jogada no oceano foi encontrada por alguém. Mais ainda, quando o receptor da mensagem é tão improvável como este caso dos detentos”.

A leitura, dentro desse contexto, pode mudar a vida das pessoas encarceradas. Para Menalton, todo livro afeta o leitor: Para o bem ou para o mal. Se não afetar, não valeu a leitura”. No caso dos reeducados, acredita que o efeito tem tudo para ser mais forte do que para um leitor comum, uma vez que eles se encontram momentaneamente privados de liberdade.

Em “Que Enchente me Carrega”, o autor traz a história do sapateiro Firmino, em processo de decadência social e mental. Ele se dá conta de que seus produtos artesanais perderam espaço para os calçados fabricados pelas indústrias, de que a única coisa que sabia fazer foi ultrapassada pelo tempo e pela tecnologia.

Além da obra que já compõe os Clubes de Leitura das penitenciárias, Menalton acredita que todos seus romances, exceto os juvenis e infantis, poderiam ser lidos por reeducandos. E que, pessoalmente, não tem para si uma obra de sua autoria como preferida: É o caso de sentir uma emoção diferente com cada obra”.

Começou a escrever para crianças e adolescentes ao ter contato diário e mais próximo desse grupo ao ser professor do Ensino Médio: “Passava as semanas todas em contato com adolescentes, ouvindo suas opiniões, suas queixas e expectativas. Isso me deu a vontade de falar deles para eles”.

Mesmo quando cursou Letras não pensava em dar aulas. Sempre teve como prioridade a produção literária: “Queria simplesmente dominar as técnicas da narrativa, melhorar minha cultura literária, e, no fim do curso, estava com um diploma que me dava uma profissão”.

Na virada do século 2000, o autor venceu o Prêmio Jabuti, o mais tradicional prêmio literário do Brasil, com a obra “À Sombra do Cipreste”. Menalton confirma que, se não tivesse vencido, sua carreira não teria existido: “Uma carreira literária no Brasil é extremamente difícil, e se não houver um fato, neste caso o prêmio, a carreira dificilmente decola”.

O livro traz 17 contos escritos durante sete anos sobre histórias focadas em situações e circunstâncias do cotidiano. Escritor de romances e contos, Menalton escolhe quando a história encaixa em um gênero ou em outro dependendo da criação da obra: O conto é o solo já o romance é a orquestra”.

Nos contos, a linguagem necessita ser mais enxuta, elaborada, economizando nos meios, espaço, tempo e conflito. Já o romance dá espaço para diversos conflitos, muitas personagens, além de espaço e tempo sem limites.

Hoje, aos 80 anos, não vê a literatura brasileira atual com bons olhos: “Não me entusiasma muito”. Reflete que a mídia promove, sem competência, pessoas próximas normalmente sem aptidão. Os prêmios ainda palidamente revelam algumas boas obras. Poderiam fazer mais”.

Campanha Abril Literário

A leitura e a educação são vistas como agentes transformadores dentro da sociedade, elementos que constituem a cultura e uma civilização. Neste dia 23 de abril lembraremos o Dia Mundial do Livro e do Direito do Autor por meio da campanha Abril Literário. A ideia é entrevistar autores que são lidos no sistema prisional, na busca de mais visibilidade e valorização para as iniciativas pró-leitura para pessoas privadas de liberdade.

A Fundação ”Prof. Dr. Manoel Pedro Pimentel” – Funap, órgão vinculado à Secretaria de Administração Penitenciária (SAP), incentiva a formação de leitores por meio do Programa de Incentivo à Leitura- ”Lendo a Liberdade”, política pública de Estado que articula projetos, com os mais de 100 Clubes de Leitura instalados em unidades prisionais paulistas.

Cada Clube de Leitura envolve, em média, 20 reeducandos. Em cada mês, o reeducando é convidado a ler um título, participar de debates sobre a obra com os demais membros e, ao final, desenvolver uma resenha crítica, que poderá render a remição da pena. Cada texto aprovado pode significar até quatro dias a menos no cárcere.

A ação é uma iniciativa desenvolvida pela Funap e SAP em parceria com a Academia Paulista de Letras (APL).

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